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A Epistemologia do Tractatus

Nuno Venturinha

Existe pouco consenso entre os estudiosos acerca do papel da epistemologia no Tractatus de Wittgenstein. Se na sua Introdução Russell menciona a “teoria do conhecimento” como um tema central da obra, Dummett tomará o Tractatus enquanto exclusivamente dedicado à “teoria do significado”, sem qualquer traço de considerações relacionadas com a epistemologia ou psicologia. Esta comunicação parte da receção do Tractatus feita pelos positivistas lógicos do Círculo de Viena no contexto da sua conceção científica do mundo, que rejeitava qualquer tipo de epistemologia kantiana. Tornou-se progressivamente claro que existem diferenças marcantes entre o positivismo lógico e o Tractatus, mas nem sempre estas foram devidamente ponderadas. Uma das mais importantes diferenças reside nas conceções contrastantes que defendem em relação à natureza das proposições matemáticas. A conceção positivista de que as proposições quer da lógica quer da matemática são analíticas contrasta fortemente com a conceção de Wittgenstein para quem, como é exposto nas proposições 6.2 e ss., a matemática consiste em equações e não em tautologias. Compreender esta diferença é crucial para se compreender o peculiar quadro epistemológico do Tractatus que, apesar das aparências em contrário, ainda deve muito ao programa kantiano de uma lógica transcendental. As proposições 6.3 e ss. sobre representação científica são particularmente esclarecedoras da perspetiva quase kantiana de Wittgenstein.