CultureLab • Ciclo temático

Bruno Duarte e Alexandra Fortes

Leituras críticas sobre a experiência da cidade – 6.ª sessão

Bruno Duarte e Alexandra Fortes, “Passagens de Walter Benjamin: Goldsmith, Kishik”

Resumo
Bruno Duarte

Walter Benjamin definiu de forma lapidar o método para o seu projecto das Passagens (1927-1940): “Montagem literária: Não tenho nada para dizer. Apenas para mostrar”. Mas enquanto a crítica filológica especializada se apressou em reconstruir de forma arquivística a ‘obra das Passagens’ de acordo com o que acreditava ser a intenção do autor, o mundo da arte entreviu nas palavras de Benjamin a possibilidade de se apropriar do seu método tomando-o à letra: a ideia de um livro unicamente formado por citações passou a servir de molde para um discurso sobre a criação e a não-criação artísticas. Um exemplo disso é o livro de Kenneth Goldsmith Capital: New York, Capital of the 20th Century (2015), que pretende transpor para um espaço e um tempo distintos um título (Paris, Capital do século XIX) e uma prática (a montagem de citações) pré-definidos. O que significa o conceito de “montagem” no espaço-limite entre a arte e a filosofia? Quais os limites da apropriação de uma obra que nunca chegou a sê-lo, e que juízo pode declarar essa apropriação como legítima ou ilegítima?

Alexandra Fortes

David Kishik imagina a “vida póstuma” de Benjamin em Nova Iorque, e, inspirado-se nela, as que ele teria analisado. O seu livro, The Manhattan Project, é uma experiência de pensamento, de filosofia da cidade e de crítica cultural. Simulando um comentário a um projecto inexistente sobre Nova Iorque, de Walter Benjamin, David Kishik aduz uma ficção de interpretação que alimenta outras ficções: as semelhanças entre a análise de Paris no projecto das Passagens e a de Nova Iorque no Manhattan Project. Ambas resultam de uma montagem literária cuidadosa, intencionalmente fragmentária, que explora as diferenças entre um Benjamin parisiense e um Benjamin nova-iorquino, em particular no que respeita ao abandono da concepção de “visão holística original”, que obrigava a confrontar os fragmentos com noções de ruína e de perda, e a adopção de um método que reúne os fragmentos num mosaico de formas de vida. The Manhattan Project salvaguarda a possibilidade de um “todo homogéneo (…) a que damos o nome de Nova Iorque” – uma “abstracção consciente” ou “grande narrativa urbana” ficcional. Trata-se pois de um exercício de imaginação que ilumina as nossas maneiras de viver, em especial nas grandes cidades.